quinta-feira, 31 de março de 2011

A LÍNGUA: UM FENÔMENO - PARTE II


Hoje vamos acompanhar uma análise Bakhtiniana da prosa de Dostoiévski, na leitura do acadêmico Philipe Macedo Pereira, feita a partir das aulas de teoria literária da professora Taiza Mara R. Moraes.


Bakhtin, ao procurar desvendar os tipos de discursos presentes na prosa, cita o discurso dostoievskiano em função de seu conteúdo altamente complexo, onde a diferenciação linguística de uma personagem a outra é menor que em comparação com outros autores. Não havendo variados estilos de linguagem em uma obra, também não há como ‘estereotipar’ as personagens, de tal forma que acaba-se criando um misto de expectativa e incógnita por parte do leitor, que não possuirá desde as primeiras páginas do livro a resposta de qual é heroi e qual é vilão.
Bakhtin também cita as relações dialógicas presente nos textos, citando-as como extralinguísticas e frisando que a linguagem apenas existe na comunicação dialógica de quem a utiliza, remontando também ao fato de que determinados grupos possuem determinados estilos e modos de se apoderar da palavra. Dessa forma, o mesmo acontece durante a escrita, onde determinado escritor utiliza-se da palavra de modo diferente ao outro escritor. O mesmo se dá com a relação de entendimento por parte do leitor, sendo que o conceito que o leitor ‘x’ terá de determinado trecho do texto não será o mesmo que possuirá o leitor ‘y’, devido a diversos fatores, tais como nível de instrução, nacionalidade, orientação religiosa entre outros. O autor se constitui como aquele que expressa a opinião presente no texto, sendo que qualquer parte do texto é capaz de possuir sua própria significação dialógica. No discurso bivocal não há separação muito nítida do enunciado citante e do enunciado citado, ocorrendo dessa forma um dialogismo interno.
Bakhtin cita fenômenos metalinguísticos, que usam a própria linguagem para explicar a linguagem, o código explicando o código. Cita a estilização, paródia, skaz e diálogo, quatro fenômenos que em comum têm o fato de que dentro de seus domínios a palavra é carregada de um duplo sentido, possuindo o discurso enquanto palavra (o que está escrito) e o outro discurso (além do texto). Bakhtin cita o discurso direto e imediato objetivamente orientado, capaz de nomear, apontar, representar, e o discurso representado ou objetificado, comum aos heróis, sendo que em uma obra percebe-se o discurso do autor e o discurso do herói, sendo este discurso afastado daquele, elaborado como o discurso de outro, a fim de promover a distinção das personagens no texto. Na estilização, o autor utiliza o discurso de outro, enquanto esse discurso por sua vez será sentido como o discurso de outro, não configurando assim uma imitação, uma vez que o autor utiliza-se desse meio com um propósito, uma intenção pré-determinada. No entanto, dentro do discurso não há interferência do autor, o qual apenas o orienta, ficando fora do texto. O autor não utiliza de sua própria palavra, no entanto usa-a de dentro para fora, como discurso de outro, de forma a atender seu objetivo. Porém, a estilização pode sim tornar-se imitação caso o estilizador entre no texto e derrube a barreira construída.
O skaz seria introduzido a partir da voz do outro, uma voz socialmente determinada e com pontos de vista a serem utilizados pelo autor, ou seja, um narrador. Neste contexto, cita-se a Ich-Erzählung, a narração em primeira pessoa, a qual pode fundir-se como discurso do autor.
Bakhtin retrata o discurso parodístico como sendo usado de diferentes formas, podendo-se parodiar um determinado estilo, uma forma de pensar, falar, sendo possível parodiar as formas superficiais do discurso (neste caso, aspectos de linguagem) ou os princípios profundos (a fundamentação do discurso com suas ideias, opiniões, visão de mundo). No discurso parodístico é comum o uso de ironia e emprego ambíguo do discurso do parodiado. Já na polêmica velada, o discurso do autor é orientado para seu objeto, como em qualquer outro discurso, no entanto qualquer afirmação é construída de forma a atacar o discurso do outro sobre o mesmo assunto e objeto, sendo que no discurso literário se sente a importância da polêmica velada, uma vez que todo discurso literário sente de forma mais ou menos branda seus ouvintes, leitores, críticos e pontos de vistas. Considerando que a palavra não é um objeto e sim um meio constantemente ativo e sujeito a contínuas mudanças, que nunca basta a uma só voz. Bakhtin também esquematiza a classificação do diálogo, sendo na primeira instância o diálogo diretamente orientado para seu objeto como expressão de última instância representativa do falante, na segunda o discurso concreto, aquele que representa um alguém, e o terceiro seria o bivocal, orientado para o discurso de um outro, como citado anteriormente.




REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail; PROBLEMAS DA POLÍTICA DE DOSTOIÉVSKI; Editora Forense; 1981


http://www.rodrigoscama.com.br/introducao-ao-pensamento-de-bakhtin.html
http://www.lpeu.com.br/a/O-que-%C3%A9-fun%C3%A7%C3%A3o-metalingu%C3%ADstica.html

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